TUGAZOMBI

cadáver semi-frio com cereja na terceira narina

quarta-feira, junho 28, 2006

James Whistler (1875)

pois de flor sei o mas e o i
morreu na caixa bafejada
p'los filhos que a foice focinhou
.
atrás dos patos vai o ei
a mor do u sem tecto
dito efeito pirotécnico
.
rebendita a erecção do lume
ao coito de raspar tachos
que é humor doméstico

segunda-feira, junho 26, 2006

Tríptico Isa: à espera de novo acorde de luz

são 2 ? serão 3 ?
será então o caos
a verdadeira amnésia de uma matemática de
[medusa.

juntam-se à esquina para dançar o triângulo.
são reais ? sim. estátuas de lodo vigiam o falso lobo.
estão em linha. desalinhados horizontalmente
[inquietos e mudos

agora nus expostos e convocados pelo número O.

anulam-se. vampirescamente. e não sabem de
[geometria.

e cai o dia. e sobra o cenário.
Isabel Mendes Ferreira

esperamos por ti

no

BJO

sexta-feira, junho 23, 2006

Tríptico Paula Modersohn-Becker


























PARTO

Tudo começa com um grito.
Depois vem o sol e depois as chuvas
e depois um pântano,
onde o amor se afunda.
O tempo passa, o pólen seca, os cabelos
são brancos;
já nada floresce como outrora, clamorosamente,
nos pátios de uma ilha,
nas cidades do mar.
Tudo acaba com um grito
entre murmúrios e cânticos de maternal
solidão -
dar à luz é dar à morte.
José Agostinho Baptista
in Agora e na Hora da Nossa Morte

terça-feira, junho 20, 2006

de tanto ouvir «El Pájaro» de Lhasa de Sela

miro viro giro
devolvo-te pássaro
passarinho passarilho
ao ninho de pétalas
onde me cresces vinho
ó pássaro
despassarado alado
.
desce andarilho
ao milho
teu bico eu morda
com árduo pulmão
de corda que
à borda temo
lá pássaro
passarinho passarilho
ouço o remo
oxalá garras no ramo
qu'iças aí pássaro
se atiças de ti
lago d'amarras
grita ovo abre
cruz ó mago
eclode sarça
esvoaça fogo
passa amigo pássaro
passarilho passarinho
mas leva-me
contigo

sábado, junho 17, 2006

Alexei Jawlensky (1910)

soa pé ao búzio
que carrancudo
chupa placentas
e nele suspira
o mar
.
mulheres em palco
mães mãos escoam
bílis agreste
e esfregam olhos
em terreno cabeludo
línguas curvam
botões carnais
baile sulcando
nos braços
timbre hipnótico
.
e cresce um
veio roxo
escurece-se cavilha
dum coração
comedor de sal

quarta-feira, junho 14, 2006

Man Ray (1921) / Marcel Duchamp (1947)
























uma lágrima quente sem que a náusea ao de leve
me arrebate
por incompleto me seja eu mesmo
com vírgula aborrecida e
contando tê-la como alimento
à entrada dum matadouro
.
.
porque difícil é adivinhar dissonância nasal
espatifado em esponjosa contrição mamária
nunca sabendo se
lâminas labiais irão trabalhar
numa de sucumbirem grossos riachos
ao clorídrico suor
dada a serventia acrilírica
de corpos submersos no carvão nocturno - assim
avivasse ele mais negro
destoantes pregas na cama
seguindo carícias dos anéis no parágrafo madalénico
da cobra
empalada já num receptáculo arbóreo deste dia mau


segunda-feira, junho 12, 2006

Benini (2006)

ontem dei por mim a passar por ti, não vou dizer aonde, estavas de costas, viravas a cabeça, vias-me pelo canto do olho e algo nas cores da roupa te cambiava o tom do olhar, sorrias a meio da boca, torcias os lábios, nada dizias, eu parada na montra a decifrar as mensagens dos carros a passar no vidro, tão depressa, tão inútil, tão arrepiada na curva das pernas onde o teu olho bicudo furava,
tão depressa,

tão profundo, só a paragem do metro testemunha, e os sacos das compras encostados, asas de plástico no meio de nós, não te lembras?

Alice

terça-feira, junho 06, 2006

Tríptico Pedro Homem de Mello

à barriga da árvore
.
acorrem assombrados dentes
.

e suplicam rangentes

musicam doentes

sempre crentes

no rebento que ela há-de parir

.

Porfírio Al Brandão in Sombras Ombreiam Lugares

segunda-feira, junho 05, 2006

TRINCA-PEDRAS

quando os animais de vento animados sepultam ventosas
e brincam com as gengivas num inoxidável bacio
é porque esperam a onda helicoidal da fonte refractada
onde os trinca-pedras lavam as patas
desalentados pelo tédio de excretarem néctar pelas narinas

sabem no fundo estes pássaros que tudo acaba no açúcar
sempre demasiado doce até bafejar ácido
e por isso povoam o ar com alforges de banha nas asas
delineiam inimagináveis corpúsculos
quântica areia espasmódica dos olhos medrados
na negação do azul

eternos reprimidos no carrocel latifundiário
filmam tremores ofuscantes em voo picado
debicam cegos o swing de luz oxigenado
todos eles morrem velhos e sedentos de areia
e eu aqui num jogo de atear maçãs
que de olhar esganado os piloros selados das pedras
ganhei o meu tique nervoso na perna direita
Porfírio Al Brandão

sexta-feira, junho 02, 2006

Tríptico Georgia O’Keeffe (1928-23-41)

.é sobre a linguagem que me executo
e encosto os sinos

e me sangro numa espécie de força no terreno das mães.possessiva.

brotar nuclearmente

é vergar o crânio nu e criar víboras das flores paradas.

os buracos da respiração são tumultos
e as noites patas monstruosas a luz o ouro.

Cristina Néry