TUGAZOMBI

cadáver semi-frio com cereja na terceira narina

segunda-feira, janeiro 02, 2006

3

é o vento que me convoca, é o vento que me provoca
e a cadeira balouça: o velho
estirado completo na sua demência obscura
no seu passar igual dos anos
com a maresia dum louco cérebro à solta

balouça digerindo música seu diminuendo
da única alegria bebendo fluidos
planam pássaros
dolorosos cansaços vistos ao espelho
todo o dia toda a noite
e durante o sono masca aquele grão de loucura
obstipado na glândula
que à tarde amena se subtrai

ele repica passos, envolve-os em geleia crispada
e há migalhas na mesa
e há cadeiras fixas na memória
desmaiadas no pensamento
e há a ardência indolor dos olhos
água que jamais ressuscitará

irá de novo lançar redes para embrulhar peixes
e embalá-los num sono de alcofa
nunca mais dirá o seu nome
nem acariciará a fotografia
e o álbum há muito que é uma sepultura
há muito que alberga apenas traça
na sua vida minúscula
com vivência alegre da sua minúscula memória
mas que vive
vive
mesmo que minúscula a sua alegria

o velho arderá na planície
e nunca mais se ouvirá nele o eco da montanha

que algum dia lhe haviam falado
Porfírio Al Brandão
in episódios

6 Comments:

Blogger isabel mendes ferreira said...

é muito bom Porfíro. mesmo. do melhor. excelente.

grande abraço.

parabéns.

11:46 da tarde  
Blogger Rosario Andrade said...

Querido Porfirio,
Perfeito. E para a perfeicao nao ha adjectivos.
(Cada vez gosto mais de vir aqui ler-te...)

Abracicos!

3:29 da tarde  
Blogger isabel mendes ferreira said...

não trabalhes Porfírio....há coisas palavras sentidos sentimentos que não se elaboram....surgem são voam planam e alcançam plenitudes insuspeitas....continua.


b ei j o s.

5:25 da tarde  
Blogger martim de gouveia e sousa said...

louvável episódio este e, no entanto, outros existem. abraços.

10:58 da tarde  
Blogger isabel mendes ferreira said...

B.E.I.J.O.

11:14 da tarde  
Blogger Conceição Paulino said...

e qnd o velho arder na planície na luz, no fogo, nas línguas dançantes ribombará pela última vez a voz-eco da montanha.
Lindo.
Bjocas de luz e paz

7:28 da tarde  

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