TUGAZOMBI

cadáver semi-frio com cereja na terceira narina

terça-feira, fevereiro 28, 2006

15

um aproximar surdo resvala
gaseificado enjoo neste terço minguante
permanecerão tábuas do enleio submarino
esboroada geografia humedecida na vertical

ouço-lhe estalos pulmorares
sei-lhe o esforço que as mós pleurais fazem
pra não esmigalharem bolhas no
[contrabalanço líquido
.
quero dormir no incêndio do crepúsculo
ferido a vinte e um metros de profundidade
afogar os olhos e desmaiar nesse exercício
de afundar cabelos
Porfírio Al Brandão
in episódios

segunda-feira, fevereiro 27, 2006

"Ando isolado na planície. Os cadáveres passam e erguem-se muito direitos num cumprimento militar. Sento-me na Torre Gelada." [António Maria Lisboa]

Vieira da Silva (1944)

sexta-feira, fevereiro 24, 2006

14

gira o cordão umbilical no microondas
futuro-tômbola prá plateia d'estômagos

ao atolar-se um pé na passadeira
toda a dicotomia evapora tracejante com
contrafluxo das gentes em grosso tempero

quem arrisca estatelar-se branco quer beber
petróleo no poço escuro do tímpano
que não tem por poltrona
e cisma de camaleão-intempérie
a icebergue educado

passeia escorreito vento intentando fellatios
num xadrês citadino:embalsamam-se peões
por sonharem paralelipípedos contrariados
Porfírio Al Brandão
in episódios

quinta-feira, fevereiro 23, 2006

"ao volante da noite assustadora o homem mais sonâmbulo do mundo cobre-se de um vermelho vivo imaginado" [Al Berto]

Adolph Gottlieb (1961)

ATENÇÃO: comuniquem se souberem alguma pista relevante sobre o desaparecimento da Rita. BEM-HAJA

13

a vespa vem matar

asas nupciais às cócegas
quase me lancetam
a garganta

sou plas lâmpadas doidas
da negra água brotam poldras
teclas húmidas a serem esculpidas
por trutas fluorescentes

ninhos ardem à conta do gás venenoso
suspiro da mãe-hematoma
neste dia feliz

chega de encobrir pevides em vítrea lamela
da colossal gravidez
que é a língua

Porfírio Al Brandão
in episódios

quarta-feira, fevereiro 22, 2006

"quem dentro da língua de fogo?"

[Martim G. Sousa]
Mark Tobey (1954)

terça-feira, fevereiro 21, 2006

12

bêbado o profeta escoa salivas
as alucina por algemas barbudas
no habitat do verme – tricota o hábito
das algemas desfiando seda
descendo a outro salivar
que alcoólico se insinua a mucos perfeitos

profeta enquanto ossos
equilibrados no sopé do precipício
e espera, fica à espera e
tampouco desespera

espera o parto da manhã d’aço
lendo o leite emulsionado
no espaço – gotas de luz
grafismos de sémen

sílabas rasantes à vista

venera a soberba mancha lenta da abóbada
pressupõe que alguém será a voz da sarça
num minuto assim estranho como exacto
ao redor duma cratera ensanguentada
Porfírio Al Brandão
in episódios

segunda-feira, fevereiro 20, 2006

"Eu quero gritar paralém da loucura terrestre"

[H. Helder]
Guy Denning (2006)

sexta-feira, fevereiro 17, 2006

11

ela sorriu às avessas e despiu a cidade
dizimou formigueiros soprando auréolas de fumo
- veio ridiculenraizar o amor


viaja num vagão azul
com a cadência solta das vértebras encharcadas
de quotidiano
massaja barro traduzindo assobios de flores
e estrangula lírios depois de os amamentar

perco-a em tantas faces
e ela nas escadas das nuvens de tão meu
céu confidente
tão meu refúgio quão
écran mutilador

sigo-lhe o arabesco mágico do cheiro
a pique num amor fatiado
mordo-me por doar açúcar mercantil

ao mínimo malabarismo com ovários
aquele sorriso apodrece

e explodem-lhe vilosidades numa cartolina
enfeitiçada igreja dos gnomos de barro
Porfírio Al Brandão
in episódios

quarta-feira, fevereiro 15, 2006

O sol é o esplendor da Vulgaridade. (T. Pascoaes)

Edwin Gardiner (2003)

segunda-feira, fevereiro 13, 2006

10

à luz ressurgem os cornos da bicicleta
e fico no que se camufla
pois retombam exageros de sangue
numa camisa às riscas
que a avó apertou ao peito
e beijou

aclareia-se-me a berma da estrada
pelo choro estilhaçado que o ranger comove
tal lasca de mundo ou folha granítica
intermitente de irmão a irmão
onde se desdobrou vida aos jorros
aliada ao musgo e à terra

presente ainda essa camisa
das nódoas só as dos beijos permanecem
e martelam
na minha cabeça
Porfírio Al Brandão
in episódios

quinta-feira, fevereiro 09, 2006

Helen Frankenthaler (1987)

terça-feira, fevereiro 07, 2006

et voilá: mouches volantes, a arte da destruição... com fina teia se enegrece



sábado, fevereiro 04, 2006

o voo liberta cor porque as penas fumegam

Hans Hofmann (1943)

quinta-feira, fevereiro 02, 2006

9

desço o limbo de isaac
cruz da cavalgaria assassina
disseram-me «o amor lava melhor
que qualquer sabão em agonia»
– estão mortos, mortos todos
subtraídos às esquinas do globo


há festim no jardim dos reis comuns
reis à procura da coroa

atolados na copa fértil
fundo víneo marulhando
fólios ascendendo a animais
vagabundos bebem-lhes a seiva encarnada
que lhes chaga o rosto
e o veneno trará boa ressaca narcísica

vénus calou a filha derramando-lhe ácido
na língua tenramente rosada

bem espremidas suas bolsas
caídas maduras da constelação movente
– festejemos a mortandade higiénica
dos que nus pingam ranho
no epicentro do templo
com cor esfomeada d'incenso

hoje vi voar a águia esbracejando

diante dum espelho, não vou estar só
e cuspirei nesse machado vindo a lume
borbulhante na espiral virulenta dos olhos

Porfírio Al Brandão
in episódios