TUGAZOMBI

cadáver semi-frio com cereja na terceira narina

quarta-feira, novembro 30, 2005

subir à noite minerais do sono: Chagall

terça-feira, novembro 29, 2005

relembro infância, grito FRÁGUAS!

e quando grita o coração bucólico lembro-me de todas as manhãs em que acordava com os beijos mornos da avó a colocar-me o relógio no pulso, em que comia sopas de leite acompanhadas pelo sábio sorriso do avô. depois, ainda espreguiçando, soltava as vacas cada uma por sua vez: a RAMALHA irreverente, a MORENA adolescente, a BONITA feminina e a chefe TURINA. rumo à INFESTA de enxada no ombro, mordendo o imaginário atrás do bando liderado por TURINA-olhos-de-pessoa; à entrada do lameiro a alegria dos insectos esvoaçantes saltitantes deslizantes no mar-de-erva; à margem do rego minúsculos calvários [o tempo] rãs crucificadas viradas para o sol em plena quaresma. o calor convidava os moscardos e as vespas – praga sobre as vacas – saqueadores abatidos pelas verdes giestas que se iam tornando vermelhas: o esplendor de PORTUGAL!
PS: Este post é hiperautobiográfico
e dedico-o aos meus amigos Luís e Sofia,
também habitantes dessa aldeia mágica
de nome Fráguas. Encontrei este texto
nas entranhas do meu quarto, caverna
da desordem. Desde já peço desculpa
pela enxorrada emocional que o envolve.

segunda-feira, novembro 28, 2005

Mulheres, 2.

Mulheres.1, pintura alemã da alemanha nacional socialista. Busch.

domingo, novembro 27, 2005

ZARAH LEANDER

sexta-feira, novembro 25, 2005

ÁLIBI

nu.
saboreio a nula mordidela
esfregando nos membros azeite de trevos azulados
produzidos em estufa hipotérmica
simulacro da asmosfera

parábolas de halogéneos escorrendo aritmética;
decifro o fandango de línguas – à noite o cupido
trinca-as,
charada da imundice que é pecado

nu.
brinco ateado pelo vapor ígneo da água lenta
a erguer muralhas silentes, o CO2 assobiando
no labirinto das grutas profundas – nu
mergulho na salmoura de espuma


Porfírio Al Brandão
in Iconocaptor
pré-publicação

quinta-feira, novembro 24, 2005

DAS TERRAS LUSAS PARA AS GERMÂNICAS. para ti tércia.

Jan Brueghel

quarta-feira, novembro 23, 2005

PROJECTO DE SUCESSÃO

Para o Mário Henrique

Continuar aos saltos até ultrapassar a Lua
continuar deitado até se destruir a cama
permanecer de pé até a polícia vir
permanecer sentado até que o pai morra


Arrancar os cabelos e não morrer numa rua solitária
amar continuamente a posição vertical
e continuamente fazer ângulos rectos


Gritar da janela até que a vizinha ponha as mamas de fora
pôr-se nu em casa até a escultora dar o sexo
fazer gestos no café até espantar a clientela
pregar sustos nas esquinas até que uma velhinha caia
contar histórias obscenas uma noite em família
narrar um crime perfeito a um adolescente loiro
beber um copo de leite e misturar-lhe nitro-glicerina
deixar fumar um cigarro só até meio
Abrirem-se covas e esquecerem-se os dias
beber-se por um copo de oiro e sonharem-se Índias.

António Maria Lisboa
in poesia, assírio & alvim 1995

terça-feira, novembro 22, 2005

e porque há noites assim,

segunda-feira, novembro 21, 2005

DILÚCULO

holofote – o pastor das cabras que enojam o mundo

crescem canas verdes no baldio dos olhos
pendem cápsulas nos lóbulos das orelhas – estratos vicejam
na gaguez matinal,
ousam recriar a mensagem fotoeléctrica do holofote
enquanto perturbado pastor

jejuam plantas
em contínuo coito assistido pela rara lascívia
de artrópodes bem-humorados
com o seu quê de obscenidade ardilosamente
explorada
pelo leque versátil de sobreluzidos apêndices

só e sonâmbulo,
estado de quem conhece a refractária pérola de lis;
no lugar do coração um caroço – é uma estátua
cujo bronze amadurece

Porfírio Al Brandão
in Iconocaptor
pré-publicação

domingo, novembro 20, 2005

domingo de tarde. com basquiat. porque chove lá fora. acho.

sábado, novembro 19, 2005

" toda a mulher patusca é pitorna no falar. " epigrama de helio T.

hoje realiza-se um recital de poesia no Erato - café com livros (Viseu). 15h00. festival de musas desnudas.

Erato, Simon Vouet

sexta-feira, novembro 18, 2005

da solidão.

Leni Riefenstahl

quinta-feira, novembro 17, 2005

MESA PARA UM

comprei rosas vermelhas para o jantar.
de tão avesso natural, amputo-lhes as pétalas e meço
a cova triangular do peito aborrecido – como tudo
se faz tão igual

sucumbem ao serem cozinhadas, povoam-nas cores
da ignomínia – as rosas destronadas no prato.
revelo-lhes a fúria metálica e estridente dos talheres, e
no alto da coluna humana a boca impacientemente
cromática, já fonte.
ao mastigá-las olho-as por dentro, avanço no corredor
da perversão; aí denoto o busto poliédrico de vivo
movimento, florindo para íntima navegação
na mesa oceânica, onde presas se entrecruzam
as ondas de pinho

melancólica nuvem de espuma – sobrevém-me

o dia cru
Porfírio Al Brandão
in Iconocaptor
pré-publicação

quarta-feira, novembro 16, 2005

Amadeu de Souza-Cardoso (1911)

terça-feira, novembro 15, 2005

ao génio de LENI.

esquecer a vida antes de ti. e esquecer, tudo, depois de ti. em ti. (a. aroso, erato bar, hoje)

Egon Schiele (1917)

domingo, novembro 13, 2005

...e a vida, afinal, é como as orquídeas – reproduz--se com dificuldade. (Al Berto)

Georgia O’Keeffe (1941)

sexta-feira, novembro 11, 2005

VISITA

quem por fogo revolve a água solar sem julgamento?
quem entrará, navegando entre grades, na caverna
do deslumbramento?
quem por avalanche entrará no vitral montes acima?
montes de mim, pergunto – quem entrará no vitral
por avalanche, sem o mínimo sono labial?

brisa amena dentro de casa – irmã,
desfaz as arestas do pesadelo com o laser saudosista
escondido por entre as dobras deste céu.
quem soerguerá os barcos na maré solar, salvando-os
da tempestade? quem explicará sem derrame,
o pássaro de amor enforcado no arame?

arranquem-me o nome... descobri que num sorriso
de mulher
coelhos morrem, cobardes assassinam-se
entre si
por doçura doentia, sobre a palha estaladiça.
como render-me sem arma nos ombros da mulher
que morre com o assobio das almas por arder?
quem entrará por despejo rasgando os pulmões
desta página que bafejo?
por quem? com quem? em quem? cães
salivantes auscultam-me
a carne

Porfírio Al Brandão
in Iconocaptor
pré-publicação

Ernst Ludwig Kirchner (1915)

palavras são / fragmentos / de noites sem desejo. / tormentas ocultadas / feridas / que os lábios ensanguentam.

Alexandre Aroso
in a escavação dos túmulos
pré-publicação 2005

quarta-feira, novembro 09, 2005

crê no alvoroço que lhe dá a fuga / adivinha pegadas / sozinha ali mesmo renasce / desfiando silvos por chutar / penteados aos arbustos

terça-feira, novembro 08, 2005

NECTURNO

anoitece
e não quero anoitecido este sangue

ofício gritante este, o de descer a escura noite à procura

do sopro que dizimou esconderijos do mapa
com a cinza ácida do meu abandono aos astros

é com esta luz que eu observo um cavalo a atirar-se
da mais alta cascata
com o peito florindo de paixão
os olhos sonhando abertos, o rosto empedrado
as patas curvadas e o peito florindo na queda
florindo e esmagando-se contra as rochas

o último relincho é o pólen anoitecido
memória adentro – falso néctar a envenenar as palavras

na garganta

nunca desejei como agora beber na cauda dum cometa

estremeço libertando a gaivota que pousará ferida
nas tuas mãos… aonde o bico?
e o esterno é uma adaga de sal que fragiliza
a simples ideia de amar
ou um nariz de quartzo pingando néon

que ilumina a raiz das diminutas asas

Porfírio Al Brandão
in Iconocaptor
pré-publicação

disto se faz o amor.

segunda-feira, novembro 07, 2005

E AGORA?

Rosário Andrade, As Três Graças, óleo s/ tela, 2005

se fosses flor serias orquídea assim tão branca de escamas e sal e
saudade
se fosses pedra ou chama serias ardósia ardente secreta luz secreto
fogo luminoso
tudo o que é pouco anguloso frio versátil rusga árvore pulmão abraço
que arranha
aranha nas minhas ancas mas
se fosses mais perto areal oásis casa música combustão ou apenas a
tua mão na minha
serias garganta língua mordaça e então só então serias a penumbra
afinal o único lugar
onde te dispo de metáforas e te beijo. no meio do deserto.
E agora?

Isabel Mendes Ferreira
in PIANO
www.mendesferreira.blogspot.com

domingo, novembro 06, 2005

essoutro lugar retém/ouro de bissectriz cicatrizada/a diluir sob manhas/de querer adoptar/uma estrela

Wassily Kandinsky (1908-09)

CICATRIZES

eis as cicatrizes do corpo da cidade. perto da memória, nem só fungos. há o gelo dos charcos e o fumo do esquecimento. quantas vozes e ecos debaixo das velhas tílias? perdeu-se um lenço desde a velha casa. nascendo o dia, ouve-se ainda o bulício da praça. o mundo envelheceu face à limpidez da imagem. e, no entanto, as formigas negras cresceram, incómodas. duas mulheres pisam o hálito quente da terra. uma festa, longínqua, declina. na velha estação, ao fundo do corpo, a chuva irrompe pela madrugada, queimando os dedos e as veias. o despertador acorda no espelho matando a alegria da revelação. dentro de mim, o comboio mata a cidade.

Martim de Gouveia e Sousa
in Incisões
Jornal do Centro 4/11/05

PAUL KLEE E O PEIXE DE LUME

se repentinamente
a infância me doesse a meio da oceânica noite
no espelho de rubra água cercada pela treva
onde nenhum rosto ousa reflectir-se brilharia
o minúsculo peixe de lume
e na obscuridade púrpura sua cabeça de ouro
incendiaria o transparente interior das anémonas

as escamas em jade fulgurando
simulam um sol em cada sonho
vibra um búzio triste uma alga ou um peixe como este
cresce a partir do centro rubro da tela
acende e apaga o distante pulsar da infância

acordo em sobressalto
deparo com a subtil inteligência do peixe
imobilizado na magia barata dum bilhete postal
sei que está numa galeria de arte em hamburgo
deixa-se consumir pelo tempo
e pelo olhar dalgum visitante furtivo sonhador

Al Berto
in A Vida Secreta das Imagens
contexto 1991

sábado, novembro 05, 2005

um poema abandonado à nascença. procuramos o seu progenitor. agradecemos a reivindicação do seu autor!

"...um sonho inteiro interior extremo insidioso
o sonho do ainda não sonhado
apenas bebido nos lençois sedosos
dos líquidos absurdos
suspiros abraços
dos braços perdidos estalados feridos amordaçados
na boca do luar na flor do deserto na poeira do fundo da terra..."

isa: pressuposta mãe-adoptiva...
o (a) autor(a) que se manifeste!

Gustav Klimt (1907-08)

... as palavras gloriosas. rasguei a carne nos espinhos. é preciso de noite ver a luz. e o sangue ilumina. ergue a pedra do sono.

e quem a vê não a vê. a rosa é o ardor do deserto. inflama a ponta da língua.

C.S.A.
in legendas&etcaetera
www.apor.blogspot.com

sexta-feira, novembro 04, 2005

" porque não precisam de palavras / os que se intuem secretamente idênticos"


eloy sánchez rosillo. ( obrigado ao PIANO, pela imagem. )

quinta-feira, novembro 03, 2005

passam e cravam-nos de chagas, os outros. e só lentamente morremos, empalados, depois. demasiado lentamente. sobra a carne. o sangue foi queimado.

terça-feira, novembro 01, 2005

foi...

foi
se o bobo
classiturno vier
entreter bocas
cheias
irá
irado confessar
pérolas alheias qu'estilhaçam
dentes
é
trauma de papel
necro........ sado
Porfírio Al Brandão
in Sombras Ombreiam Lugares
pré-publicação 2005

Van Gogh (1889)